A Criação de um espaço pessoal
Importa referir que o termo "política", aplicado neste contexto, não é um simples artificio retórico, mas uma forma de posicionamento em termos do futuro desta formação. Dado que todos desejavam fazer cinema no futuro próximo, necessitavam dinamitar um espaço para si mesmos num meio dominado por um pequeno numero de produtores e fechado à novidade. O panorama do cinema francês à época encorajava esse posicionamento. Por um lado, aquilo a que se chamava "Le Cinéma de Papa", um conjunto de adaptações literárias com valores seguros de produção mas académicas e inócuas. Truffaut cristalizou esta objecção num texto de 1954 intitulado "Une Certaine Tendance do Cinéma Français", comparando a este panorama estagnado a vitalidade do cinema americano, numa perspectiva inovadora, pois Hollywood era tradicionalmente considerada o espaço que tinha terminado a carreira de génios como Murnau e Eric von Stronheim, bem como uma espaço dominado pelo McCarthismo. Por outro lado, nenhum destes criticos se identificava com a crítica do seu tempo, considerada elitista e que sofria, de novo segundo Truffaut, de "sete pecados capitais": 1) falta de conhecimento da história do cinema; 2) total ignorância da técnica cinematográfica; 3) completa falta de imaginação; 4) uma injustificada preferência pelo cinema francês, devido às suas relações pessoais com os realizadores; 5) um tom paternalista e insolente; 6) a idade excessiva dos intervenientes; 7) a pretensão de julgar o trabalho de acordo com o que s acreditava serem as intenções do criador.
Cahiers du Cinéma: a plataforma A plataforma para estas ideias foi a revista Cahiers du Cinéma, inaugurada em 1951 e a escola para toda a geração da Nouvelle Vague.
Ao longo da sua história, a revista sempre teorizou e contestou aquilo a que se chama "a função crítica". De acordo com esta perspectiva, a sua prática foi sempre a de que os filmes não deviam ser apenas compreendidos e desfrutados, mas igualmente fontes para de entendimento do mundo e da vida - o que pode ser explicado pelo facto de os fundadores da revista, André Bazin e Jacques Doniol-Valocroze, se perspectivarem como críticos de arte na tradição de Denis Diderot, que defendia essa mesma perspectiva. Sobretudo, a crítica cinematográfica era vista como uma actividade iniciática, cheia de virtudes para a actividade futura.
Quando esta formação se retirou da escrita e da teorização, a Cahiers du Cinéma tornou-se uma revista diferente, e vivendo um pouco do prestigio desta era, mas nunca deixou de produzir críticos interessantes que se tornaram, posteriormente, cineastas interessantes - Luc Moullet, Léos Carax e, acima de todos, André Téchiné, passaram pela redação. Sobretudo, um genuíno amor pelo cinema ainda enforma os seus conteúdos, e é dada atenção generosa às diversas cinematografias mundiais.
Correntemente, a revista encontra-se no numero 608.